Condicionamento físico de cães atletas
Retirado do livro Reabilitação e fisioterapia na prática de pequenos animais, dos autores Levine, D. et al.
“O condicionamento físico pode ser definido como o processo de preparo físico e mental para a realização de uma atividade física intensa. Um cão atleta bem condicionado e treinado requer um proprietário, treinador ou tratador comprometidos com o programa de condicionamento bem definido. O treinamento cardiovascular e musculoesquelético são partes fundamentais do programa. O treinamento também é importante, pois ensina o cão atleta as especificidades de cada atividade esportiva, também influenciando no comportamento do animal.
O condicionamento inicia precocemente na vida de um cão atleta, porém exercícios intensos são contraindicados quando filhotes, porque as epífises ósseas ainda estão abertas. Cada tipo de cão tem um período diferente de fechamento das epífises. Antes do fechamento das epífises, o condicionamento se restringe a brincadeiras e atividades voluntárias (corridas e caminhadas).
É importante que o animal seja testado ou que tenha sua família analisada, para evitar que doenças exacerbem, como a displasia coxofemoral. O condicionamento propriamente dito se inicia na puberdade, quando os hormônios andrógenos surgem, pois são importantes para o desenvolvimento muscular.
ALIMENTAÇÃO
Outro ponto chave no condicionamento de cães atletas é a nutrição. Ela deve ser balanceada e completa, com ingredientes de qualidade, de preferência ração super premium. É importante para manutenção e crescimento do cão atleta. Durante o período de exercícios intensos, os cães não devem ser alimentados.
O esvaziamento gástrico é atrasado em mais de 1 hora pelos exercícios quando o cão é destreinado.A hidratação é de suma importância, devendo ser fornecida água de qualidade à vontade, principalmente em ambientes mais quentes.
SISTEMA CARDIOVASCULAR
Durante a realização de exercícios físicos, ocorre um aumento na frequência cardíaca e na pressão arterial. Com o tempo, também ocorre aumento de hemácias no sangue. A frequência cardíaca é maior em cães obesos sendo exercitados do que em cães com peso normal. Com o tempo, o treinamento leva à adaptação do sistema cardiovascular. Estudos em humanos atletas revelaram uma diminuição da frequência cardíaca quando a pessoa está em repouso. Esse fato é particularmente observado durante o treinamento de resistência, mas também se apresenta como resposta ao treinamento de fortalecimento.
TESTE DE PREPARO
A resistência e adaptação ao exercício são avaliadas por meio de corrida em esteira, testes de caminhada com duração de 6 minutos ou pela performance física do cão durante atividades em espaço aberto como gramado, campo ou pista.
INÍCIO DO CONDICIONAMENTO FÍSICO
Durante a montagem de um plano de treinamento, é feita a escolha da frequência, intensidade e duração dos exercícios. A frequência é definida como o número de ciclos de exercício em um período de tempo (por sessão, dia ou semana). Em excesso podem ter impacto negativo no treinamento, irritar uma condição existente ou causar uma lesão, por causa do repouso insuficiente, a fadiga muscular ou cardiovascular excessiva, ou do estresse colocado sobre os tecidos durante a atividade. Não existem descrições científicas sobre os parâmetros ideais de exercícios de condicionamento físico e manutenção de cães atletas. O programa será feito especificamente para o seu cão, por um médico veterinário capacitado.
FORTALECIMENTO
A força muscular pode ser definida como a capacidade de um músculo ou grupo muscular de gerar tensão e uma força resultante. A força muscular é muito importante para cães de corrida. A força está intimamente relacionada à velocidade, como nos Greyhounds de corrida, que são muito fortes e podem alcançar uma velocidade de até 70km/h. O hormônio do crescimento pode aumentar a massa muscular em cães.
EXERCÍCIOS
Os exercícios de fortalecimento muscular se baseiam em alguns princípios básicos gerais, como o da especificidade e da sobrecarga.
– Princípio da especificidade: se refere à necessidade de treinamento dos sistemas do corpo usados durante uma atividade esportiva. Esse princípio aplicado no fortalecimento muscular visa o fortalecimento e treinamento dos grupos musculares responsáveis por uma ou várias ações necessárias para que o exercício seja realizado. O programa de fortalecimento deve ser específico para cada cão, direcionado ao tipo de atividade muscular necessária para a execução do exercício que o cão faz. Vamos dar um exemplo de um cão atleta que participa de competições de frisbee. Esse cão, em particular, acelera rapidamente em linha reta, salta, desacelera, vira-se, novamente inicia uma corrida e pula sobre um obstáculo. Então, para esse cão, o plano de fortalecimento dos membros pélvicos deve ser feito para aumentar a aceleração da corrida e o impulso do salto. Já o programa para seus membros torácicos será direcionado para aumentar a capacidade de desacelerar e girar o corpo.
– Princípio da sobrecarga: é o fator mais importante no programa de treinamento. O princípio diz que para aumentar a força (ou a resistência), deve-se empregar uma carga excedente à capacidade metabólica dos sistemas muscular e cardiorrespiratório durante o exercício. Esses sistemas devem ser exercitados até que cheguem à fadiga, para que se alcance uma melhor performance esportiva.
Os exercícios de fortalecimento incluem trote, trote em superfície inclinada, brincadeiras controladas usando bolas, puxar pesos ou carroças, galope, natação, dança, recuperação e carrinho de mão. Atividades de velocidade incluem a aceleração e desaceleração rápidas em aclives e declives, brincadeiras com bolas e até brincadeiras e corridas com outros cães.
RESISTÊNCIA
A resistência é extremamente importante para cães atletas que fazem atividades de esforço prolongado, como o pastoreio. Os exercícios aeróbicos de resistência geralmente exercitam os grande grupos musculares por mais do que 15 minutos, e são realizados várias vezes por semana. A atividade aeróbica é responsável pelo aumento (a longo prazo) da oxigenação e vascularização dos tecidos musculares; e também pela perda de peso. Também nesses atletas se observam outras mudanças, como a diminuição da frequência cardíaca em repouso e aumento da capacidade de volume cardíaco, o que resulta em diminuição da pressão sanguínea em repouso, entre outras melhoras.
Todos esses fatores contribuem para um melhor desempenho esportivo. O treinamento também deixa mais fortes os ossos, músculos e tendões; e aumenta a resistência dos ligamentos e das cartilagens. Se o cão não tiver fatores como obesidade e deformidade nos membros, por exemplo, a atividade física não irá predispor à osteoartrose. Para o treinamento de resistência são usados o trote, a natação, esteira aquática ou terrestre e tração.
EQUILÍBRIO E PROPRIOCEPÇÃO
As atividades físicas melhoram o equilíbrio e a propriocepção. O equilíbrio é a capacidade de adaptação durante a locomoção ou estação, sendo que também está relacionado ao ajuste na mudança de direção ou de superfícies. A propriocepção é a percepção inconsciente do movimento e da orientação espacial gerada pelo corpo. Para um melhor desempenho nas atividades do cão atleta, a propriocepção e o equilíbrio devem estar aprimorados. O treinamento proprioceptivo pode ser feito com caminhadas em círculo ou em 8 e atividades de transposição de objetos de diferentes tamanhos e formatos. Os exercícios de equilíbrio são os que exigem uma resposta rápida à mudança de inclinação, como trampolim, natação e prancha de equilíbrio. Outras atividades de equilíbrio e agilidade incluem transposição de cavaletes, mudanças rápidas de direção durante o trote ou galope, exercícios com bola terapêutica, dança, carrinho de mão, cabo-de-guerra e brincadeiras controladas com bolas.
Outro ponto muito importante no plano de condicionamento físico é o repouso. O repouso auxilia na prevenção da fadiga muscular e de lesões por uso excessivo. Entretanto, quando o cão está condicionado, as pausas para repouso são diminuídas, além de ser responsável pela redução das taxas de ácido lático circulante ao término de atividades musculares intensas.
Além disso, o condicionamento físico previne a síndrome da rabdomiólise, que ocorre pelo acúmulo de íons hidrogênio no tecido muscular durante o exercício; edema e isquemia musculares; morte de hemácias localizadas nos tecidos musculares; mioglobinúria e insuficiência renal. Essa doença é mais comumente observada após exercício intenso e em cães com pouco condicionamento físico.”
Exercícios assistidos na hidroesteira, com diferentes níveis de profundidade de água, com ou sem bóia e brinquedos, tornam as sessões de Fitness recreativas e produtivas para melhorar a performance e o condicionamento físico de cães atletas,´melhorando também sua qualidade de vida!
Para um bom controle dos benefícios de treinamento, devemos monitorar ganho/perda de peso, interesse pelo alimento, hidratação e uma medida da musculatura das coxas também pode ser útil (essa medida deve ser feita com uma fita métrica).
Quanto à dieta, é claro que deve ser a melhor possível. O aporte protéico para cães em treinamento severo, chegou a 53% em cães de trenó, sem qualquer sinal de danos hepáticos ou renais. Os carbohidratos (não vamos aqui discutir nutrição!) tem importância reduzida já que o cão tem capacidade de convertê-los a partir de várias fontes. O mesmo se observa com relação às gorduras.
Já a suplementação de perdas de sais na dieta parece revelar poucos efeitos positivos, mas realmente, os estudos com relação a este tema são muito poucos.
CUIDADOS ESSENCIAIS
Na época atual, a preparação física dos cães tornou-se um tema de destaque, assim como a associação de treinos de proprietários e cães para a manutenção da saúde de ambos.
Quando os sistemas do organismo são forçados pelo trabalho físico, o corpo responde a fim de aumentar a capacidade para reduzir o esforço (resposta de treinamento).
Alguns componentes do corpo melhoram o desempenho mais rapidamente do que outros. Os mais lentos são as estruturas dos sistemas cardiovascular e esqueléticos (músculos). Os músculos expostos a esforços freqüentes e prolongados aumentam um número significativo de capilares por mm. Após alguns meses, atingem 100% de eficácia (o que permanece com a manutenção adequada).
O coração também aumenta em tamanho e os ossos se reorganizam, assim como os tendões e ligamentos se reforçam. Em geral, o período para se notar uma melhora vai de 2 a 6 meses. Já a massa muscular responde mais rapidamente.
MANEJO DE TREINAMENTO
Os cães, desde que possam se mover, devem ser encorajados a brincar e a se exercitar, respeitando-se os limites relativos à sua maturidade.
No início, quando mais exercício livre, respeitando o sono, a alimentação, etc… tanto melhor, pois beneficia o sistema de transporte de oxigênio (principalmente o enzimático). O criador e posteriormente o proprietário, deve encorajar os filhotes sozinhos ou em grupo, conforme a raça e o temperamento, evitando sempre que as brincadeiras transformem-se em brigas.
Já na fase de adestramento, a partir dos 4 a 6 meses, iniciamos com uma caminhada de 2 a 4 km, conforme a condição do cão e do treinador, 2 a 3 vezes na primeira semana.
A distância e a velocidade da caminhada podem ser aumentadas a cada semana, até um limite a ser considerado, conforme o objetivo.
A partir de 6 ou 7 meses, os incrementos de esforço (velocidade e distância) devem ser apenas quinzenais. Na necessidade ou na proximidade de competições, esses aumentos e cargas podem ser até diários. Quanto a esta frequência, existe muitos aspectos a abordar, mas de maneira geral, o treino deve ser feito mais do que uma vez por semana, por que menos do que isso se resulta infrutífero.
VARIAÇÃO DE TREINOS
Há outras formas de treinamento como natação, esteira, Hidroesteira, brincadeiras livres (bolas, iscas etc) ou no caso do Agility, onde o próprio exercício pode ser o treinamento.
Existem muitas teorias em relação à rigidez ou flexibilidade do ritmo de treinamento, mas neste caso temos que respeitar a individualidade do cão, sob pena de termos um animal apático e desinteressado.
O programa de treinamento deve ser desenvolvido EM CONJUNTO pelo veterinário, treinador e proprietário, com o objetivo de conseguir o melhor desempenho do cão sem afetar sua saúde.
MONITORANDO RESULTADOS
Gostaria ainda de citar os danos causados pela exaustão, pelo excesso de impacto sobre as articulações, pelos “achismos” desencontrados e uso de anabolizantes.
Claro é que, submeter um cão ainda não totalmente formado ao estresse do treinamento físico ou, pior ainda, fazer longas “férias! entre os períodos de treinamento, parecem atitudes no mínimo impensadas. O dano causado sobre as extremidades de ossos longos, ligamentos e cápsulas articulares pelo uso de técnicas de alto impacto, determina até o abandono do animal para fins de esporte.
Por último, vale ressaltar o volume excepcional de efeitos colaterais pelo uso de esteróides anabolizantes e das fórmulas “geniais” de suplementos absolutamente não testados cientificamente e que transformam cães de futuros atletas de sucesso a ” ferro velho” sem futuro.
REGRAS DE OURO
- O exercício deve ser, antes de mais nada, uma atividade prazeirosa para o cão e não um tormento.
- Não force seu filhote a uma carga de exercício muito alta. Um filhote, especialmente de raças grandes, só atinge seu ápice em termos de massa muscular e ossatura após 24 meses.
- Não utilize nenhum suplemento ou vitamina sem consultar seu veterinário.
- Na prática de natação, a primeira coisa que ele deve aprender é como sair da piscina.
- Nunca deixe seu cão sozinho na piscina, uma vez que ele pode afogar-se pela exaustão de ficar nadando para se manter na superfície.
- As caminhadas mais severas nas raças grandes também podem ser feitas com bicicleta ou moto, mas sempre respeitando o ritmo do cachorro.
- Nunca faça exercícios com o seu cão nas horas mais quentes do dia. Prefira o começo da manhã ou o final da tarde.
Fonte: petfisio.com.br